sexta-feira, 18 de maio de 2012

COMO SALVAR O POLICIAL MILITAR DO PADM INCOERENTE?

O aplicador da sanção disciplinar não é, muitas vezes,  o fomentador da indisciplina?




Um alerta deve ser feito aos praças integrantes das polícias militares no Brasil que estejam respondendo a processos administrativos disciplinares (PADM): se o seu superior hierárquico cometeu semelhante infração disciplinar e não foi punido, você também não poderá ser punido se esse fato não for devidamente esclarecido com a devida motivação legal. No entanto, a maior dificuldade é descobrir o resultado dos processos administrativos disciplinares quando os acusados são os oficiais superiores, pois suas punições são publicadas em boletins reservados, sem direito de acesso aos praças, logo não há como efetuar uma ampla defesa, isso é incoerência.
Em um passado recente, o então Governador do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra (PT), havia terminado com esse tipo de expediente (boletins reservados), justamente para fortalecer os laços da hierarquia e da disciplina sob a ótica da moralidade e da transparência dos atos de seus administrados. Infelizmente, o Governador que o sucedeu, Germano Rigotto (PMDB), ressuscitou o antigo expediente, dificultando a defesa dos praças submetidos a processos administrativos, parciais, além de submetê-los, muitas vezes, às decisões desproporcionais.
Felizmente o STJ, em decisão recente, tem assegurado acesso de documentos sob sigilo para embasar a defesa de terceiros. Para maior esclarecimento leia a íntegra do texto abaixo:
STJ - Quinta Turma assegura acesso à denúncia sob sigilo para embasar defesa de terceiro
Um advogado teve assegurado o direito de acesso à denúncia de uma ação penal na qual não possui procuração e que tramita sob sigilo, para instruir defesa de seu cliente em outra ação penal. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que pela primeira vez enfrentou o tema.
O caso é singular, como destacou o relator, ministro Jorge Mussi. Um motorista de São Paulo foi denunciado por homicídio qualificado com dolo eventual, acusado de provocar a morte de nove pessoas ao dirigir embriagado um caminhão pela rodovia Presidente Dutra e colidir com vários veículos.
Ao juiz de primeiro grau, sua defesa requereu, então, cópia da denúncia de outra ação penal, esta em trâmite no Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), envolvendo um promotor público que teria atropelado e matado três pessoas. Ele foi denunciado por homicídio culposo (sem intenção de matar).
A defesa do caminhoneiro alega que, embora tenham praticado a mesma conduta, os réus receberam tratamento legal e processual diverso. Por isso, a denúncia contra o promotor, que tramita sob sigilo no Órgão Especial, seria prova essencial à tese da defesa, que quer a desclassificação do tipo mais grave (dolo eventual) para o menos grave (culposo).
Subsídio à defesa
Inicialmente, o juiz negou o pedido. A defesa do caminhoneiro apresentou habeas corpus ao TJSP. A 12ª Câmara Criminal considerou “pouco verossímil que a denúncia cuja cópia se deseja obter seja a única prova apta a subsidiar a defesa” no que diz respeito à incompatibilidade entre a conduta e a imputação.
Além disso, afirmou que “o sigilo do processo a que responde o promotor foi decretado pelo mais alto órgão jurisdicional do Poder Judiciário bandeirante” e, portanto, o juiz ou a câmara criminal não teria competência para requisitar cópia do processo ou levantar a determinação de segredo.
O julgamento do caminhoneiro teve data marcada e, com isso, o ministro Mussi determinou o sobrestamento da sessão do júri até a análise do pedido formulado no habeas corpus. A Quinta Turma seguiu integralmente a posição do relator.
Simetria entre os fatos
Mussi observou que o princípio constitucional da ampla defesa deve abranger o direito de o acusado defender-se com a maior amplitude possível. Ainda que a norma processual estabeleça que o juiz poderá negar a produção de prova requerida pelas partes, para o ministro a decisão, no caso, foi “equivocadamente fundamentada”.
O juiz, ao negar à defesa do caminhoneiro o acesso à cópia da denúncia contra o promotor, afirmou que “a eventual simetria entre os fatos não justifica a juntada ou a quebra de sigilo decretado por outro juízo”.
“É exatamente a aparente simetria entre os fatos que justifica o pedido do paciente em ter acesso à cópia da exordial de outra ação penal, visando o cotejo entre aquela e a sua acusação”, destacou o ministro relator.
A decisão da Quinta Turma determina ao juízo de primeiro grau que solicite ao Órgão Especial do TJSP a cópia da denúncia contra o promotor, para instruir a ação penal promovida contra o caminhoneiro.
Processo relacionado: HC 137442
Fontes: Superior Tribunal de Justiça & http://www.ibccrim.org.br/site/noticias/conteudo.php?not_id=14018
Com isso, todo o praça, submetido à PADM, precisa de um Advogado (defensor técnico), pois somente por intermédio dele é que o policial militar terá acesso a ampla defesa e ao devido contraditório, podendo bater à porta do STJ em busca de justiça, pois infelizmente a maioria dos praças, submetida a um PADM, sente-se injustiçada com o procedimento, pois não possui a técnica apurada para se defender, além de sentir-se condenada por um pré conceito do encarregado que muitas vezes sacrifica a dignidade da pessoa humana no altar da imposição do medo para que sirva de exemplo aos outros.

A ILEGALIDADE DA BUSCA DOMICILIAR REALIZADA PELA POLíCIA MILITAR


(LOPES, Fábio Motta. A ilegalidade da busca domiciliar realizada pela polícia militar. In Boletim IBCCRIM. São Paulo : IBCCRIM, ano 17, n. 204, p. 02-03, nov., 2009).



Nos últimos dias, tem-se percebido uma tendência de alguns (poucos, felizmente) magistrados de concederem, com a indiferença de promotores de justiça,(1) mandados de busca e apreensão para serem cumpridos por policiais militares, em atendimento à representação, em crimes comuns, dos próprios milicianos. Talvez em nome da “segurança pública”, quando deveriam preservar direitos fundamentais e a ordem jurídica, esses juízes não se dão conta de que estão autorizando militares, em pleno regime democrático, a ingressarem em residências de civis. Trata-se, pois, de uma flagrante ilegalidade – que também acaba alimentando, ainda mais, a falta de integração entre as polícias –, como se passará a expor.

É sabido que a Constituição Federal, no art. 144, §§ 1º e 4º, conferiu às polícias judiciárias (Federal e Civis) as funções de investigação criminal, exceto com relação aos crimes militares. Por sua vez, o CPP, no art. 4º, também estabelece que a apuração das infrações penais e da sua autoria é atribuição das polícias judiciárias.

Dessa forma, caberá a tais polícias – e não às militares – a representação perante o Poder Judiciário por mandados de busca e apreensão, bem como a realização das buscas domiciliares, atividade típica de investigação criminal e voltada à garantia ou segurança da prova(2). Se assim não fosse, a busca domiciliar não estaria regulamentada no Código de Processo Penal, que a classifica como meio de prova(3)e que estabelece, a partir do art. 240, a forma de cumprimento dessa medida cautelar.

Com isso, como bem registra Pitombo, os mandados de busca e apreensão deverão ser cumpridos “pela polícia civil, órgão da administração direta com função de polícia judiciária, nos limites de sua atribuição”(4 ),cabendo à polícia militar, em vez de usurpar funções conferidas a outros órgãos policiais, repassar às polícias judiciárias eventuais informações que demonstrem fundadas suspeitas para buscas em residências.

Aliás, há até mesmo quem sustente que os policiais militares sequer poderiam realizar buscas pessoais, por também se tratar de uma medida cautelar penal que, em razão dessa característica, somente estaria afeta às polícias judiciárias(5).

À polícia militar, por outro lado, incumbe o importante papel de exercer as funções de policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública (art. 144, § 5º, da CF), assim como a apuração de crimes militares, razão pela qual, a contrario sensu, não se deve conceder (e não se concede) às polícias judiciárias, nessas hipóteses, mandados de busca e apreensão(6).

Não se pode esquecer, igualmente, que a inviolabilidade do domicílio, direito fundamental assegurado no art. 5º, XI, do texto constitucional, é a regra. Assim, para que seja afastada essa garantia, deve-se observar o princípio constitucional do “devido processo legal” (art. 5º, LIV, da CF), que também se aplica na fase pré-processual(7). Em decorrência desse princípio, em razão dos dispositivos já citados, só as polícias judiciárias, no curso de investigações criminais formais(8), havendo fundadas razões e com autorização judicial, é que poderão proceder à inviolabilidade de domicílios em cumprimento a mandados de busca e apreensão. Os direitos fundamentais servem para limitar o poder estatal e os policiais, a exemplo dos demais servidores públicos, apenas poderão praticar atos autorizados pela lei, o que não ocorre quanto a buscas domiciliares, nas infrações penais comuns, com relação às polícias militares.

Analisando o princípio do due process of law, explica Giacomolli que, no processo penal, desde a investigação, devem ser observados, rigorosamente, as fórmulas e os ritos estabelecidos pelo legislador, que se destinam ao estabelecimento de limites ao poder dos agentes estatais(9). Destarte, existindo representação por buscas domiciliares e cumprimento dessas diligências por órgão que não possua tal atribuição, estar-se-á diante de flagrante inconstitucionalidade, por violação do princípio do devido processo legal.

Em decorrência disso, ainda que se esteja diante de um crime permanente e que o ingresso na residência tenha ocorrido em cumprimento à ordem judicial, a prova obtida deverá ser considerada como ilícita, por violação a normas constitucionais e infraconstitucionais. De fato, o que motiva o ingresso dos militares em domicílios não é a certeza da ocorrência de um crime – requisito necessário para a incidência do art. 303 do CPP e de uma das exceções do art. 5º, XI, da CF (flagrante delito) –, mas a ordem judicial. Assim, o encontro casual de algum objeto não serve para legitimar uma violação de domicílio baseada em uma ilegal autorização judicial.

Como a polícia militar não tem legitimidade para deduzir pretensão cautelar perante a Justiça Comum e não cabe à autoridade judiciária substituir, indevidamente, a autoridade policial, a apreensão de bens nessas circunstâncias deve ser considerada como prova ilícita, que afeta as demais que dela decorrem, “contaminando integralmente o processo”(10), em respeito ao art. 5º, LVI, da CF, e ao art. 157 do CPP. Sendo a prova ilícita, não poderá o delegado de polícia realizar auto de prisão em flagrante nessas situações, principalmente naquelas (não raras) ocasiões em que os presos, antes de serem apresentados na Delegacia de Polícia, são encaminhados aos quartéis, onde serão fotografados e “interrogados” pelos milicianos, em continuidade às “investigações”.

Também é importante consignar que o juiz, apesar do disposto no art. 242 do CPP, que deve ser interpretado de acordo com o texto constitucional, não pode decretar de ofício medidas cautelares de busca e apreensão. Em respeito ao sistema acusatório, adotado pelo sistema jurídico brasileiro, e à necessária imparcialidade para julgamento, os juízes não devem determinar, ex officio, medidas investigatórias de busca e apreensão(11). Se deferir de ofício, porém, deverá enviar os mandados às polícias judiciárias para cumprimento, em respeito à Constituição Federal.

Portanto, se a Magna Carta estabeleceu como regra a inviolabilidade de domicílio, assegurou como cláusula pétrea a observância do devido processo legal e definiu de forma clara as atribuições dos órgãos policiais, somente as polícias judiciárias é que poderão realizar buscas domiciliares, função eminentemente de investigação criminal. Como bem salientou a min. Ellen Gracie, em voto proferido na ADI 3.614/PR, que declarou a inconstitucionalidade de decreto paranaense que conferia a policiais militares funções exclusivas de delegados de polícia, entre as quais a lavratura de termo circunstanciado, “as duas polícias, civil e militar, têm atribuições, funções, muito específicas e próprias, perfeitamente delimitadas” na Constituição Federal e que não podem ser confundidas.

Interpretar em sentido contrário é banalizar a violação de domicílio e abrir um precedente perigoso no sentido de que, em breve, também se faça uma construção para que o Exército entre em residências a pretexto de “preservar a ordem pública”. A conclusão decorre de um raciocínio lógico: se as polícias militares, que são forças auxiliares do Exército (art. 144, § 6º, da CF), “podem” proceder a buscas domiciliares, por que não se poderia estender tal atribuição às Forças Armadas?

Nunca é demais lembrar que, no processo penal, a busca da verdade (ou da reconstrução histórica dos fatos) é limitada pelas normas e pelos princípios constitucionais. Como registra Badaró, no “processo e, principalmente, na atividade probatória, os fins são tão importantes quanto os meios”, não sendo a busca da verdade “um fim que possa ser atingido a qualquer custo” (12).



Fonte: http://www.ibccrim.org.br/site/boletim/exibir_artigos.php?id=3974